A 4ª turma negou HC para devedor preso mesmo tendo quitado 95% da dívida.
Em decisão apertada, por três votos a dois, a 4ª turma do STJ rechaçou a aplicação da teoria do adimplemento substancial em relação a obrigação alimentar, que afastaria a prisão civil do devedor de alimentos. Prevaleceu no julgamento o voto divergente do ministro Antonio Carlos Ferreira, presidente da turma.
Na primeira sessão da turma, no último dia 2/8, o relator do HC que tratou do tema, ministro Luis Felipe Salomão, aplicou a teoria do adimplemento substancial, concedendo ordem de ofício para devedor de alimentos que pagou 95% da dívida:
“Apenas quando a prestação alimentar for suficientemente satisfatória, cuja parcela mínima faltante for irrelevante dentro do contexto geral, alcançando resultado tão próximo do almejado, é que o aprisionamento poderá ser tido como extremamente gravoso, frente a tão insignificante inadimplemento.”
Bem jurídico indisponível
Na sessão desta quinta-feira, 16, o presidente Antonio Carlos apresentou voto-vista divergente. Ao denegar o pedido do paciente, o ministro afirmou que, a par de encontrar estrito espaço de aplicação no Direito contratual, a teoria do adimplemento substancial não tem incidência nos vínculos jurídicos familiares, menos ainda para a resolução de controvérsias de obrigação alimentar.
Lembrou S. Exa. que o instituto não está positivado no ordenamento jurídico brasileiro, e que a obrigação alimentar diz respeito a bem jurídico indisponível. Para Antonio Carlos, a subtração de qualquer parcela dos alimentos impostos por decisão judicial pode ensejar prejuízo à própria manutenção do alimentado. Além disso, considerou o ministro que a jurisprudência da Corte entende que o pagamento parcial do débito alimentar não afasta a possibilidade de prisão civil.
“O julgamento sobre a cogitada irrelevância não se prende ao exame do critério quantitativo. A subtração de pequeno percentual pode mesmo ser insignificante para um, mas possivelmente não para outro mais necessitado. Há de fato muitos outros elementos a serem considerados.”
Assim, continuo o ministro, há necessidade sempre do exame qualitativo, avaliação essa que não pode ser realizada sem profunda incursão em elementos de prova ou demandando dilação probatória, o que não é possível na via estreita do HC.
Por fim, concluiu que o sistema jurídico põe à disposição do devedor de alimentos o meio de rever os valores da obrigação alimentar e o motivo pelo qual deixou de pagar a mínima parcela da obrigação será analisado pelo magistrado antes de decretar a prisão.
O relator Salomão reforçou que, no caso, o pagamento da dívida foi quase integral, e a prisão seria “submeter alguém após ter pago substancial valor da dívida e demonstrar cabalmente nos autos que vem buscando a satisfação integral do debito, malgrado por diversos impedimentos não consiga”.
A tese salomônica ganhou a adesão do desembargador convocado Lázaro Guimarães, que fez paralelo com o Direito Penal, citando que o STF há muito já estabeleceu como causa de distinção da pena o princípio da bagatela.
Já os ministros Isabel Gallotti e Marco Buzzi seguiram a divergência do presidente Antonio Carlos. A ministra Gallotti sustentou: “No campo da obrigação alimentar uma pequena diferença pode ser relevante para as circunstâncias de fato do alimentado.”
A turma por maioria denegou a ordem de HC.
- Processo: HC 439.973
Fonte: Migalhas