A incursão dos advogados no mundo da política não é novidade. Mais da metade dos presidentes dos EUA (24 em 45 até hoje) saíram da advocacia. A novidade, nos últimos anos, é a incursão progressiva dos advogados no mundo empresarial, também no posto de líder — ou de CEO de grandes corporações.
Essa é uma tendência que vem se fortalecendo, de acordo com um estudo de pesquisadores da Universidade de Chicago, da Universidade Estadual da Flórida e da Universidade Stony Brook, que examinou a formação educacional de 3.500 CEOs e os comparou com os resultados de milhares de ações judiciais contra sociedades anônimas.
Uma das principais conclusões do estudo foi a de que as corporações lideradas por CEOs com formação jurídica foram menos processadas, enquanto as demais corporações enfrentaram mais contenciosos, sobretudo nas áreas de antitruste, direitos civis do trabalhador, contratos, trabalhista, valores mobiliários (financeira) e lesões corporais.
O estudo mostrou também que as corporações dirigidas por CEOs com formação jurídica se saíram melhor nos contenciosos que enfrentaram (ou perderam menos) e tiveram de fazer menos acordos para encerrar ações movidas contra elas. Isso significa uma economia considerável de recursos financeiros e humanos.
A conclusão óbvia é a de que advogados se tornam CEOs mais úteis para as corporações mais sujeitas a processos, como as dos setores farmacêutico (nos EUA), financeiro e de seguros. A visão do aspecto jurídico da administração de empresas se torna um fator decisivo no sucesso geral da organização.
Em termos de comparação, o estudo menciona os casos dos laboratórios farmacêuticos Merck e Pfizer, ambas com problemas jurídicos semelhantes: responsabilidade civil por efeitos colaterais cardiovasculares resultantes de medicamentos para artrite reumatoide. A Merck, que não é dirigida por um advogado, pagou US$ 4,85 bilhões em 2007 em acordos para encerrar processos contra ela. A Pfizer, liderada pelo advogado Jeff Kindler, pagou US$ 890 milhões em 2008, também em acordos para encerrar ações.
Um advogado, por sua formação, tem capacidade mais aguçada para prever riscos. No estudo em questão, o CEO da Home Depot (uma das maiores empresas de material de construção dos EUA), Frank Blake, advogado formado pela Faculdade de Direito de Columbia, deu uma explicação bem-humorada para esse fenômeno: “Pessoas normais vão para a Faculdade de Direito e lá elas aprendem a se preocupar com o que nenhuma pessoa normal se preocuparia”. E é isso que um advogado faz o tempo todo.
Isso pode ser bom, sob alguns aspectos, mas também funciona como um fator negativo, quando um Conselho de Administração deseja nomear um novo CEO para a corporação. Existe a ideia de que advogados são avessos a riscos e, portanto, podem desacelerar – ou mesmo frear — o crescimento da empresa.
Porém, nos últimos anos, o conceito de gestão de riscos ganhou ímpeto na economia, e a visão abrangente que os advogados têm das questões que se apresentam no dia a dia empresarial tornou-se um “plus”. Os CEOs advogados, tal como os diretores jurídicos das empresas, estabelecem políticas internas que reduzem os riscos e facilitam o compliance, disse a advogada e CEO da Spectra7 Microsystems Inc., Cynthia Cole, ao Jornal da ABA (American Bar Association).
“O cargo de CEO requer a habilidade de avaliar problemas e analisar situações por todos os ângulos, para tomar decisões mais seguras”, disse o CEO da Continental Airlines, Jeff Smisek, um ex-advogado corporativo em Houston, Texas. “E, em cargos de liderança, precisamos ser muito persuasivos na comunicação de nossa visão estratégica e na descrição do caminho que a empresa vai seguir. São habilidades que desenvolvi na Faculdade de Direito e em minha atuação como advogado”, afirmou ao Jornal da ABA.
O CEO advogado da Waste Management, David Steiner, disse à publicação algo bem parecido. “Os advogados são treinados para pensar, destrinchar os problemas e avaliar as questões por todos os lados. E isso ajuda a tomar boas decisões.”
O advogado David Dillon, CEO da Kroger Co., a maior cadeia de supermercados do país, contou que desenvolveu sua capacidade de analisar problemas na faculdade de Direito, onde aprendeu que, para ganhar ações criminais, tinha de entender o caso melhor do que o promotor. “Na advocacia, aprendi que não poderia resolver bem um problema ou uma questão qualquer sem antes examiná-los por todos os ângulos possíveis.”
Outros fatores que favorecem os advogados, quando considerados para o cargo de CEO, são a capacidade de gerir bem a reputação da empresa, cumprir a exigência imposta pela Comissão de Valores Mobiliários (SEC) de as sociedades anônimas avaliarem e declararem riscos aos investidores, administrar as regulamentações governamentais e “navegar” legislação e os tratados internacionais, no caso de expansão da corporação.
Os diretores jurídicos das corporações têm mais chances de serem alçados ao cargo de CEO, por uma razão muito simples: normalmente os membros do Conselho de Administração de uma corporação escolhem, para o cargo, alguém que eles conhecem. E três figuras são constantes nas reuniões do conselho: o CEO, o CFO (chief financial officer) e o diretor jurídico.
Fonte: ConJur